terça-feira, 13 de dezembro de 2011

MINHA MÃE .


                          Eu não a conheci.
                        Por estes misteriosos propósitos de Deus ela morreu ao dar à luz. E eu permaneci vivo, restando-me as lembranças dos relatos e algumas fotos da sua beleza e encanto. 
                      Esta é uma das fotos. Ela parece ser uma adolescente. Está em pé na segunda fileira, é a segunda da esquerda para a direita, de cabelinhos curtos. 
                    Seu pai, o meu avô está assentado no centro da foto, de terno escuro e lenço branco no paletó. 
               Sempre senti uma espécie de vazio em minha vida sem saber ao certo defini-lo ou explica-lo. Uma certa sensação de saudade por alguém que eu sequer conheci. Mas com quem tive uma ligação embrionária que marcou minha história para sempre.
                 Agradeço à Deus por ela, não apenas por ter me gerado, mas pela fé que mantinha com o Criador e Senhor da sua vida. Gostava de falar dele aos amigos e conhecidos.
                Anunciava o Evangelho por palavras, através do canto e do testemunho coerente entre crer e viver a verdade. De alguma forma hoje eu continuo o que ela começou por meio do pastoreio de pessoas, e do mesmo amor a Deus que ela nutria. 
              Sei que um dia toda a distância será descontinuada e a saudade finalmente saciada no grande encontro que a Biblia chama de ‘parúsia’, o retorno de Jesus em glória e a ressurreição de todos os que o amaram para estarem eternamente juntos com Ele. 
                Houve tempo em que um sentimento de tristeza dominava meu coração; falta de sentido; culpa pelo seu falecimento; distância do Deus de toda Graça e Amor. 
                Hoje, não mais. O que existe atualmente é gratidão e alegria por ela ter existido e ter me dado à luz. 
                    Por de alguma forma ter permitido que eu vivesse neste mundo, e com muita honra, continuar a fazer o que ela iniciou – anunciar por meio da vida Aquele que restaura os de coração ferido, erguendo-os da ausência de significado existencial e chamando-os a colaborar com o Evangelho para que muitos outros encontrem Nele a paz interior, o amor que sentem necessidade e uma razão maior para viver.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

ÓCULOS


                     Comecei a usá-los quando tinha 23 anos. Tempo de estudante em que era obrigado a dedicar horas à leitura e reflexão. Não sei se foi por este motivo, ou se já havia alguma predisposição genética, mas o fato é que eles nunca mais saíram da minha vida.                                     Tive vários, de armação redonda ao estilo Lenon, quadrados, de acetato e de metal, leves e os pesados.
                   O atual tem proteção contra raios solares e escurece, poupando-me um segundo óculos de sol. Quando completei 40 anos, em mais uma consulta de rotina, o doutor vaticinou: “Você vai ter que tirá-los toda vez que for ler ou fazer algo próximo”. Parecia uma profecia: e se cumpriu do jeito que ele disse. 
                     Hoje eu os uso para longe mas os removo para perto. Nas distâncias é necessário o auxilio das lentes que me ajudam a definir as imagens e dirigir de forma segura. Mas quando o contato é mais próximo eles atrapalham: eu preciso tirá-los senão causam desconforto. 
                      Há coisas na vida que estão determinadas pela distância: são aquelas expectativas que almejamos atingir e conquistar porque tomaram o nosso coração e os nossos pensamentos: são os nossos alvos, as nossas prioridades. Mas na maior parte do tempo elas ainda não chegaram. Nossos olhos naturais não conseguem percebe-las com nitidez. 
                         È por isso que precisamos das lentes das Escrituras, que nos ensinam a ver as coisas com correção. Nossa natureza tende a distorcer tudo que ainda não vivemos, o que resulta no sintoma da ansiedade. Mas com os óculos dos textos sagrados vamos corrigindo nosso olhar, trocando vultos por imagens nítidas e reais, destruindo assim mitos e fantasias.
                    Há coisas na vida, por outro lado, que são regidas pela proximidade. São aquelas coisas que já nos foram dadas por Deus e estão aí para serem vividas. È o nosso presente. Não precisamos de fé nestas horas, nem de esperança, porque elas já são nossas. Basta desfruta-las com alegria e celebração para que o tempo não consuma a oportunidade de provar a bondade de Deus mostrada na familia, no trabalho, no lazer, nos amigos, nos filhos que estão crescendo, nos netos que chegaram.
                              È a hora de tirar os óculos porque conseguimos ver com nitidez. Para longe, para o amanhã, precisamos de óculos ; para perto, para o hoje, devemos tira-los. 
                         A vida, portanto, é um contínuo colocar e tirar de óculos, um transitar entre o hoje e o amanhã. Por isso que não podemos usar os óculos sempre. Por isso que não podemos deixar de usá-los quando necessário. 
                         Alguns já fizeram a cirurgia. Eu ainda não tive coragem. Prefiro continuar com os óculos. Eles me lembram que não dá para fazer cirurgia na vida e querer enxergar tudo perfeito.           Os óculos me lembram da minha humanidade : ora consegue ver com nitidez, ora precisa de ajuda para enxergar.