terça-feira, 27 de maio de 2014

O alívio de ser acolhido.



'Que o nosso Deus fiel, imutável, pessoal e caloroso desenvolva a maturidade em vocês, de modo que possam estar um ao lado do outro, assim como Jesus se põe ao lado de cada um de nós. Portanto, estendam a mão e acolham uns aos outros, para a glória de Deus'. Romanos 15, na versão 'A Mensagem'.

No capitulo anterior a este, o apóstolo critica aquelas pessoas que ficam discutindo com as outras se é licito comer este ou aquele alimento, guardar como sagrado este ou aquele dia e coisas semelhantes. 

Na ânsia de tentar corrigir comportamentos alheios que julgamos ser nosso papel nós deixamos de lado duas coisas básicas do Evangelho: a primeira, que é o sacrificio de Cristo que nos substituiu na cruz concedendo-nos perdão total e definitivo; e a segunda, a necessidade de acolhermos uns aos outros para ajudarmos quem estiver em alguma dificuldade na caminhada.

Porque há muitas questões na vida que ultrapassam o simples lembrete de um principio da Biblia ou de um versiculo. Há feridas que foram feitas que acompanham pessoas o resto de sua existencia; há decisões que elas tomaram que as atrasam no seu desenvolvimento e maturidade até hoje.

 Chegar até elas e despejar textos da Biblia para dizer que estão assim por não terem aplicado aquele texto, aquele principio, aquele mandamento... é no mínimo cruel e equivocado. 

Equivocado porque Cristo veio para curar as nossas feridas e nos restaurar das nossas dores. E cruel porque eu nunca estou na pele do outro, na vida e no cotidiano dele, nem agora nem antes.

Paulo diz no texto que Deus é pessoal e caloroso. E que por ser assim Ele nos incentiva a imitarmos seu exemplo. Ser pessoal como ele é - ser humano, pessoa, gente, sensível, terno, afetuoso e que se importa de verdade em como ajudar. Caloroso porque Deus carrega de emoções a maneira como fala, trata e age conosco. Dá para se sentir aquecido nele, a alma acolhida e protegida, um grande alivio sob a cobertura da sua Graça.

Por isso ele nos convida a estender a mão ao outro, nunca estender o discurso, a critica azeda e sem envolvimento pessoal, o toque e não o tapa. 

Paulo diz que quando fazemos isso nós glorificamos a Deus. Deus não é glorificado no culto, apenas, e na liturgia dos cânticos. Ele é glorificado principalmente quando a sua ternura é vista no tratamento que damos a quem precisa. No ato de estendermos a mão a quem se sente com tanto medo que não consegue mais fazer nada, decidir nada, pensar nada, viver.

Eu convido você a aceitar esta convocação de Deus.
Sejamos acolhedores uns dos outros. Tenha certeza de que muita gente vai agradecer por isso. Há gente demais precisando ser acolhida, abraçada, pastoreada, tratada e curada.

Vamos acolher uns aos outros?

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Trabalho sujo.



      Li na matéria do Estado de S.Paulo do domingo, 18 de Maio de 2014, de que na Índia ainda existem 1,3 milhão de catadores de excrementos, responsaveis por limpar as fezes de 15 milhões de pessoas. 

Na matéria eles entrevistam uma senhora chamada Sudhira de 60 anos, que desde os 13 anos faz este trabalho sujo. Na Ìndia os catadores de excremento pertencem à chamada 'casta de intocáveis', os antigos 'imundos' do Velho Testamento diante dos quais todo mundo tinha que se desviar quando passasse por perto.

 Vivendo em condições degradantes, ganhando por dia menos de um dólar, tais pessoas nascem e morrem nesta humilhante condição, numa casta que segundo a religião do país não se move para cima. Alheios à mensagem libertadora do Evangelho de Cristo, prosseguem não apenas fazendo o trabalho sujo, mas sendo desprezados, repugnados e intocados por outras pessoas. 

Eu só não entendi se eles são intocáveis por fazer o trabalho sujo, ou se fazem o trabalho sujo por serem intocáveis. Na primeira hipótese é a tarefa de lidar com os dejetos do organismo que os impedem de terem companhias, amizades, de serem bem vistos e respeitados por seus pares. 

Mas se for o caso da segunda hipótese é pior ainda. Por serem daquela casta de intocáveis a unica coisa que são autorizados a fazer é coletar fezes, nada mais. A eles foi destinada a pior parte da escala social. Eles são como aqueles peixes que, no fundo do aquário, fazem o trabalho de limpar a água, comendo toda sujeira que outros peixes produzem. 

Há muita gente intocável, mesmo fora da Ìndia. Eles estão sujos pelos dejetos do seu pecado e de outros. Eles não cheiram bem pelo fato de que o tempo todo carregam o lixo moral das pessoas que lhes pedem socorro. Os intocáveis são mal vistos porque são confundidos como se fossem condescendentes, amassem o que não é puro, mexem em áreas que ninguem tem coragem de por a mão. 

Enquanto muitos engravatados se afastam da verdadeira humanidade à sua volta, os catadores da impureza limpam o ambiente para tornar a vida das pessoas menos poluida e insuportável. Mas pagam um alto preço por isso. Muitos confundem o que eles fazem com aquilo que eles coletam. Jogam na mesma vala comum a impureza que tocam com a vida que eles têm. 

Se você é um destes, não se desanime, porque Jesus fez exatamente a mesma coisa. Ele foi chamado de sujo pelos fariseus, amigo de pecadores, alguem que se misturava á sujeira humana. Mas voce sabe bem o que ele fez com tudo isso - carregou até a cruz nossos pecados para nos limpar e nos perdoar. 

Os seguidores de Jesus tambem fazem este trabalho sujo - lidar com o pecado alheio com discrição e misericordia, procurando ajudar a quem sofre para ficar limpo, livre e cheio de vida novamente. E no fim das contas, são os intocáveis aqueles que Deus mais toca e abençoa neste mundo.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Brisa suave.



"E depois do fogo houve o murmúrio de uma brisa suave" - 1 Reis 19:12.
Me pus a refletir na experiencia do profeta Elias, à porta da caverna, quando fugia da sua vida.

 Ele ouviu diversos sons marcados por elevado volume, tremores, ventos que despedaçavam tudo. Enquanto estes sons lhe eram ouvidos ele permanece no interior da caverna, trancado e indisposto.

 Mas de repente vem uma brisa suave, terna, afetuosa, que sopra e que, de alguma forma, o arrasta para fora e o faz reconhecer nela a Deus, que logo vem falar com ele.

Quanta falta faz uma brisa suave...
Quantos altos volumes temos que suportar diariamente, nos levando a suportar o que precisamos fazer mas com uma sensação de que a caverna parece mais atrativa e menos ameaçadora.

Repetimos para nós mesmos o tempo todo a necessidade da força, da resistência, da coragem, da fé que move montanhas. Essas coisas nos levam a crer que é isso que de fato nos torna quem hoje somos e que na atitude de lançar em nossas cavernas internas o que sentimos teremos a garantia de que tudo ficará pelo menos sob controle.

O que vemos no texto é que Deus foi aonde Elias estava. Deu-lhe pão, água e sono. Elias descobre nas coisas simples da vida como o comer, o saborear, algo que há muito não desfrutava na sua intensa agenda em prol do Reino. 

Caminhamos tanto tempo pensando em nossa utilidade que desprezamos até o fato da nossa humanidade. 
Mas quando chega a caverna ficamos sós com nossos pensamentos, sentimentos e inquietações. De alguma forma, porém, a brisa vai soprar. 

Seja por meios convencionais ou não; de lugares e pessoas até inesperadas. A brisa traz de volta a vontade de ver a luz do sol, contemplar a vida, sonhar com um futuro melhor.
Que a brisa do amado Deus sopre hoje sobre todos nós.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Meu primeiro amor.



         "Você abandonou o seu primeiro amor". Apocalipse 2.4.

         Nosso primeiro amor jamais é esquecido. Ele permanece na memória como uma lembrança de um tempo simples, onde nada era dificil e complicado para o encontro, a conversa, a troca de olhares e as incontáveis promessas.

      Não, eu não estou falando aqui de romance.
       Eu trato do amor a Deus, que é o foco da passagem.
      Jesus diz a um determinado grupo de pessoas, seus seguidores de então, que eles haviam abandonado o primeiro amor por ele.
     Eu me lembro de que quando conheci o Evangelho introduziu-se em mim uma amizade tão grande por Deus que me dava um prazer imenso orar e ler as Escrituras. 
    O mistério de não ver nada mas sentir a Ele por perto e por dentro era maravilhoso. 
     O dia começava mais feliz, com muito entusiasmo, trabalhar era algo feito não especificamente para ganhar dinheiro mas com a intenção de fazer o melhor para Ele.
      Amar as pessoas era a grande vocação, exercer o perdão, o grande desafio. Não tinha muitos problemas do tipo: frustração eclesiastica, questionamentos das intenções alheias, nem mesmo queria julgar os atos de ninguem.
      O encontro com Deus deixava a vida leve, gostosa, sossegada.
      Nos domingos, indo a pé para as reuniões da igreja, era expectativa incomparável reencontrar os amigos, sair com eles para uma lanchonete, cantar os cânticos em rodas pequenas acompanhados do violão. 
       Estar numa igreja era tão bom porque o que importava não era o lugar mas a companhia daqueles que estavam na mesma jornada da fé.

        Hoje eu assisto desolado o desencantamento das pessoas e da igreja.
        Tudo parece ter perdido o mistério, o belo, o simples.
         Hoje não convivemos como família mas disputamos espaço de forma concorrida com outros grupos.
      Tudo ficou difícil, exigente e absurdamente complexo.
      Teimamos em afirmar que Deus está em nosso grupo e não em outros, que aqui ele fala mais do que em outras igrejas, que descobrimos algum segredo não revelado que nos torna receptores exclusivos de um dom do Espirito Santo.
     
       Ridículos, nós nos achamos o canto do sagrado do mundo e quem quiser estar conosco tem que falar a mesma língua e confessar a mesma cartilha, cantar as mesmas musicas, orar do mesmo jeito, e ter a mesma 'visão' - quanta bobagem que é própria da adolescência da fé.

        Eu acho que perdemos a Deus porque perdemos a simplicidade de Deus.
       Eu tento, teimoso, perpetuar aquela noção de encantamento em minha pratica, aquela simplicidade tipica de Jesus que focava mais contato humano do que descobertas teológicas aparentemente inéditas.
       Para mim, a amizade é a principal marca da espiritualidade cristã.
       E a simplicidade do Evangelho, o seu maior convite.
       Eu não quero perder o primeiro amor.
      Temo que se perde-lo, não terei mais nada para fazer na igreja.
      Não quero, como muitos, enveredar pela politica eclesiástica, pelos conchavos,  pelo amor ao dinheiro dos fiéis, tudo em nome do poder.
     Suspeito de que, onde isso existe, Deus já pegou suas malas e foi embora.

terça-feira, 6 de maio de 2014

GUARDEI A FÉ.



Paulo diz, já bem idoso à seu filho na fé, Timóteo, que ele havia 'combatido o bom combate, completado a carreira e guardado a fé' .                     (  2 Timóteo 3.7  ). 
       Três expressões descritivas da vida daqueles que perceberam-se amados por Deus e aceitos no Evangelho de Jesus, por ele salvos da sua vazia maneira de viver. Eles conhecem o amor na pratica da solidariedade e da doação. 

         Eles amam o povo que Deus ama e gastam suas vidas, forças, saúde e bens na disposição voluntária de tornar Cristo conhecido de homens e mulheres que neste mundo estão cheios de feridas, dependências nocivas, vaidade tola e sem rumo e razão de existir. 

           Amar, contudo, como bem exemplificou o Mestre, é algo que dói, que nos traz uma certa medida de dor e de perda. Paulo disse na sua carta aos Corintios, que 'o amor tudo sofre'. E que o amor 'é sofredor e benigno'. Nem sempre ele traz alguma recompensa nesta vida; por amor muita gente se desiludiu, se frustrou ao receber como resposta uma agressão, um descaso, uma indiferença.

        Paulo conhecia bem de perto essas coisas.
Tanto que ele expressa no final da sua jornada várias experiencias que o marcaram: 'Demas, amando o presente século, me abandonou. Alexandre, o ferreiro, causou-me muitos males. Na minha primeira defesa ninguem apareceu para apoiar-me, todos me abandonaram'.            ( 2 Timóteo 4.10-16 ).

      Um currículo, convenhamos, nada fácil para alguém que se doou a vida toda pela causa de Cristo.
    Mas, apesar de tudo, ele diz: 'eu guardei a fé'.
    Ele usa esta palavra não para tratar da crença num conjunto de verdades teológicas fundamentadas na Escritura. 

      Ele o faz para se referir à sua amizade e convívio com Deus. O que sobrou de tudo o que ele viveu foi esta amizade, este amor nunca destruído, jamais afetado, nem arranhado pelas dificuldades da caminhada ou pela maldade dos homens.

        Guardar a fé é incomparavelmente mais importante do que completar a carreira e combater o bom combate. Porque não somos vocacionados para heróis a recebermos uma medalha de mérito. 

        Nosso chamado é para nos tornamos amigos de Deus. Ele mesmo nos garante que 'nada poderá nos separar do seu amor' .( Romanos 8.39).Nem mesmo as feridas recebidas de gente que jamais poderia faze-las, nem de lugares onde jamais poderiam surgir.

      Desejo que acima de tudo, na medida em que for envelhecendo, você guarde o principal. A amizade com Deus e a confiança nele é a melhor terapia para qualquer decepção, desencanto ou coisa parecida. Mantenha sua fé nele, custe o que custar.