quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Solo sagrado.




Houve tempo em que eu acreditava que Deus havia me chamado para chegar em um ambiente e em um grupo para consertar e modificar pessoas e coisas. Me achava dono da verdade e apto para, em nome dele, corrigir e alterar o que predominantemente era e estava ruim. Eu estava cego para as minhas próprias inconsistências naquele período, e me guiava muito mais pelo que deveria ser, numa projeção teórica de tudo e de todos, do que abraçar a verdade tal como estava estabelecida.

Não era capaz de ver as coisas de acordo com o princípio da Criação, segundo o qual ‘tudo era muito bom’. Não via o bem em nada e em pessoa alguma. Depois, com o passar dos anos e com uma abordagem com Deus muito mais amistosa, entendi que eu é que devo chegar e pedir licença para participar e cooperar com aquilo que ele já vem fazendo antes de eu pisar naquele solo sagrado da existência dos outros.

Então vi que é mais importante aprender antes de querer ensinar. Tenho graduação em Pedagogia e sei do poder da educação na transformação de vidas e cenários. Educar é guiar, é conduzir, é levar pela mão. Educar é partir, porém, do que me é trazido e não do que eu imagino. Tive que readaptar minha atividade ao saudável ato de escutar antes de responder ou dar algum conselho que está escrito, como se fosse fácil repetir um mantra genérico a todos, de forma generalizada.

Jesus nunca se atreveu a dizer qualquer coisa que fosse a alguém antes de ser perguntado ou antes de ser solicitada a sua ajuda. Ele não é invasor, sua atitude é de bater educadamente à porta.

Certo dia eu recebi uma garota para atendimento. Ela me estendeu uma folha enorme de papel com ambos os lados preenchidos. Leu tudo aquilo com sentimentos marcantes de irritabilidade. Dirigiu a mim algumas afirmações de que eu havia sido omisso em algumas posturas para com sua família. Depois de ouvir essa leitura carregada de emoção eu não tinha nada para lhe dizer. Àquela altura eu já sabia que seu pai estava preso por ter assassinado um outro numa briga.

Senti sua alma mais do que suas palavras. Pedi que ficasse em pé e apenas lembrei: ‘Você está precisando de um pai. Seu pai está aqui’. Lagrimas volumosas se misturaram com aquele abraço. Veio o pedido de perdão e um sorriso novamente voltou. Percebi naquela tarde que minhas palavras pouco poder teriam se a minha alma não tivesse escutado a dor.

Tudo aquilo mudou na vida daquela garota que hoje é mãe de lindos filhos e tem um lar maravilhoso. Ela, como tantos outros que atendo, são o solo sagrado que Deus me convida a adentrar e, sem a intenção soberba de dizer que sei, apenas observar, sentir, dizer que o Bem está ali. E em paz, observar plantas novas surgindo em meio á aridez do solo da vida.

Caleb Mattos.