A música de Isabella Taviane, ‘Ùltimo grão’, menciona em uma
de suas estrofes o seguinte:
“Às
vezes o amor
Escorre como areia entre os dedos
Não tem explicação para tantos erros
É melhor partir
Antes do último grão cair”.
Escorre como areia entre os dedos
Não tem explicação para tantos erros
É melhor partir
Antes do último grão cair”.
Eu me deparei com essa frase e na hora me lembrei do
conceito que Bauman faz da sociedade contemporânea, falando da sua liquidez em
todos os sentidos. Nada é feito mais para durar e permanecer. Os antigos marcos
já foram removidos e a manutenção de valores e princípios
não conta mais num tempo em que a velocidade da comunicação e velocidade da
informação se convertem em velocidade da interação e velocidade da decisão.
Tudo hoje escorre como areia entre os dedos, inclusive o
amor. Ele, que antes era considerado o cimento que ligava a toda discordância e
o remédio que a todo mal curava hoje não mais liga e nem cura. Porque o amor
que hoje conhecemos também passou pela liquidez. Ele é tão relativo como a
mesma teoria que leva este nome na Ciência.
Hoje se ama porque o amor é um bem
consumível, tenha ele o nome de sexo, casamento, fraternidade ou coisa
parecida.
Como vamos a uma conveniência (atente para este nome) e ali
consumimos sem demora o que nos traz sede e fome, fizemos do amor uma
conveniência e não uma vivência.
Amamos e deixamos de amar por qualquer razão
fútil, como, depois, voltamos a amar por qualquer carência mais ardente que
sintamos. E neste pega e larga vulgarizamos elos mais fixos e duradouros,
perdemos a bênção antiga da paciência construída justamente no calor das
provas, que nos tornava maduros e mais propensos a ouvir o outro e entende-lo.
Relações atuais são, em todos os níveis, como fogos de
artifício: brilham intensamente num segundo e logo se apagam. A geração
anterior á nossa preferia ver no amor a figura da fogueira.
Iam apanhar a lenha,
ajeitavam-na uma sobre a outra, para com certa demora conseguirem acender o
fogo. Depois, tomavam o cuidado de soprar sempre as brasas da mesma fogueira
acesa horas antes, sem esquecer de colocar ainda mais lenha nela .
Por isso é que não muito tempo atrás dizia o poeta Camões:
“Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade”.
E então? O que faremos com ele, o remédio de todos os males
da vida? Deixaremos que em nós se torne rápido estouro de luzes ou decidiremos
recuperar a velha fogueira?
Caleb Mattos
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