sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Desabafar ou Murmurar ?

Jó , no auge do seu sofrimento, amaldiçoa o dia do seu nascimento e considera mais felizes os que já morreram. Chega a afirmar que o feto abortado tem mais paz do que ele. Olha para a sua condição atual e diz que não tem paz, nem tranquilidade, mas apenas inquietação.

Em circunstâncias normais ninguém diria isso. O que leva Jó a esta declaração é o peso da sua angustia. Ele experimenta a dor física     ( enfermidade ) ,  a dor existencial ( falta de sentido para viver ) ,     a dor emocional ( morte dos filhos ) , a dor conjugal                           ( falta de apoio da esposa ) , a dor espiritual ( ser culpado de pecado pelos amigos).
E tudo ao mesmo tempo. 

È preciso colocar suas palavras no contexto da sua dor e não afastado dela. Porque a dor que ele sentia provinha de acontecimentos reais, de fatos. Muitos, no entanto, lamentam sua condição e vivem abatidos baseando-se em hipóteses não verdadeiras, em suspeitas e não em fatos.

Muito sofrimento que pessoas dizem ter não passam de um hábito de criarem em torno de si um ambiente desprovido de alegria e de esperança. Sem que necessariamente exista uma razão concreta para o lamento.

Para Jó, a própria vida havia se tornado um fardo na medida em que as razões para viver lhe foram tiradas uma a uma. Quando perde a noção de proposito, de um norte para a existência, de uma meta que lhe indique que está caminhando para algum lugar, Jó considera que estar morto é melhor do que estar vivo.

 E acima dos próprios elementos da perda, o que mais desanima Jó é exatamente esta procura inútil por uma finalidade em permanecer vivo. Por isso, é possível dizer que, acima de todas as perdas, a maior angustia de Jó é a falta de sentido para a vida; o ato de não saber para onde está indo; para quem viver; o que fazer.

A dor existencial é a que figura no pano de fundo da vida. Todas as outras dores ainda que não esperadas acabam sendo superadas com o passar do tempo. Porque de alguma forma a vida retoma o seu ritmo, amigos se aproximam e ajudam a conviver com a nova realidade, e novas experiências surgem no cenário que completam as faltas que tivemos, preenchendo aquelas lacunas que machucaram.

Mas a dor existencial – o não achar sentido para viver é a forma mais grave de todos os sofrimentos. O desejo mais latente é o desejo pela morte. Algumas percepções alimentam este sentimento em Jó.

Ele sente que Deus se voltou contra ele e o trata como inimigo: 6:4: “As flechas do Todo-Poderoso estão cravadas em mim”. Em segundo lugar, Jó considerava que para ele não haveria mais futuro: 6:11: “Como posso ter paciência, se não tenho futuro?” Terceiro, ele acha que nunca mais irá provar a felicidade: 7.7: “Lembra-te, ó Deus, de que a minha vida não passa de um sopro; meus olhos jamais tornarão a ver a felicidade”.

No entanto, justamente a atitude de colocar para fora a sua dor é que possibilitou a Jó reencontrar o sentido da sua vida e da sua historia. Ele desabafa com Deus e reconhece que isso tem um efeito terapêutico, que gradativamente vai minimizando os efeitos da dor: 7:11: “Por isso não me calo; na aflição do meu espirito desabafarei, na amargura da minha alma farei as minhas queixas”.

A recomendação bíblica para a dor é primeiro avaliar se ela procede de um fato real, ou se é consequência apenas de uma avaliação errada dos acontecimentos da vida. 

Há pessoas que de fato sofrem sem motivo; sentem dores no corpo sem nenhuma enfermidade; se medicam sem ter nenhuma doença; lamentam sem razão; reclamam sem precisar e se atormentam como se fossem uma reedição contemporânea de Jó.

Na maior parte das vezes esse é um mecanismo psíquico para chamar a atenção ou tornar-se o centro do cuidado de todos. Por isso, existe uma diferença bíblica entre ‘desabafo’ e ‘murmuração’.

 O primeiro é necessário quando existe de fato motivo; o segundo é pecaminoso porque se torna incapaz de ver as coisas boas da vida e perceber o cuidado de Deus.

Para momentos verdadeiros de dor, Deus espera que o procuremos como Jó para desabafar, colocar para fora o que nos atormenta. Isso é feito inúmeras vezes pelos salmistas e profetas. Um desabafo em forma de oração pode evitar que nos tornemos amargos com as pessoas, reativos em relação a Deus e revoltados com nossa historia.

Mas a murmuração crônica é patológica, desagrada a Deus e precisa ser tratada com arrependimento e mudança de atitude para com a vida, com as pessoas, e principalmente com Deus. 

Paulo nos recomenda dar graças a Deus em todo o tempo, ter um coração que reconhece o cuidado de Deus e sua provisão em nossa vida. Jó teve motivos para dizer o que disse, mas Deus o ouviu, não o condenou por isso, e por ultimo restaurou a sua condição.

Você tem motivos reais para se queixar da sua vida?
Tem percebido o quanto Deus tem cuidado das suas necessidades?
Tem mais dado graças do que reclamado da situação?

Tudo se resume a uma questão: crer na soberania de Deus ou viver como se a vida fosse uma série de acasos e eventos sem nenhuma ligação.

O desabafo com Deus não é errado; ao contrario, é terapêutico. Mas existe uma diferença entre reclamar de Deus, e reclamar para Deus. No primeiro caso, o efeito será amargura e deformação da fé. No segundo caso, alívio e conforto.


6 comentários:

  1. Olá,muito boa a mensagem melhor ainda é ter a certeza que em meu caso tenho muito a agradecer , pouco a pedir e saber que a alegria do senhor sempre esteve ao meu lado e ao lado daqueles que convivem comigo.ABRAÇO NA IRENE SAUDADES.

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  2. Muito bom, esse texto! Eu estava estudando sobre o livro de Jó, e me deparei com essa matéria. É bem explícita, clareia o entendimento!

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  3. Artigo abençoado, muito esclarecedor!

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  4. O texto é uma lição importantíssima para a vida de todos nós. Grato por compartilhar Rev. Caleb.

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  5. Muitíssimo obrigado, estava preocupado a respeito do significado bíblico da murmuração. Alguns assuntos como esses na Bíblia conseguem nos deixam temorosos de estarmos errando, mas é sempre bom saber que Deus é juiz e não ouve as nossas orações por palavra mas pelos sentimentos com as quais imbuímos. É muito bom poder descansar e saber que o nosso Deus nos compreende porquê pode sentir a nossa alma e avaliar o coração, assim como interpretou as palavras de Jó como desabafo da sua alma e não murmúrios.

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