terça-feira, 22 de abril de 2014

O galo que virou poeta.



No reino da bicharada vivia o galo.
Reinava absoluto sobre as aves, cercado de galinhas, perús, pombos e emas.
Todas as manhãs se levantava cedo, batia as asas e cantava longamente até o sol nascer.

Sua fama corria solta pelo arraial. Diziam todos: 'Que poder foi dado ao galo! Ele com seu canto faz o sol nascer'.
O tempo passou, e um dia o perú foi visitar as cercanias. Dormiu fora de casa naquela noite. No meio da mata onde pousou ele ouviu pela manhã vários galos cantando por perto e estranhou: 'Mas não era apenas meu amigo que fazia o sol nascer?'
Guardou tudo em segredo.

Um dia o galo acordou mais tarde e o sol já tinha nascido. Confuso ele se pergunta como isso podia ser. Até que o perú revela o segredo. Espanto geral, decepção. O galo entra em profunda depressão e não sabe mais o que fazer da vida. Parou de cantar porque percebeu que se cantasse ou não o sol nasceria do mesmo jeito.

Meses se passam. 
Um dia a bicharada acorda com o galo cantando de novo antes do sol. E lhe perguntam se ainda acreditava no seu antigo e falso poder. Ele responde: 'Antigamente eu era filósofo e cantava para o sol nascer. Hoje eu sou poeta e canto porque  sei que ele vai nascer'...

O galo me lembra a diferença entre duas palavras: Religião e Devoção.
Gosto de ser especifico no que eu falo e escrevo. Para mim os termos Religião e Espiritualidade são sinônimos porque se fundiram numa mesma idéia: aquilo que eu tento fazer para agradar a Deus e receber seus benefícios.

Toda forma de religião seja ela católica ou evangélica, espirita ou esotérica, se enquadra nesta ânsia de promover com seu esforço algum mérito que seja aceito por parte daquele em quem se crê.

Eu prefiro usar a palavra Devoção para falar do meu contato com Deus. Aprendi ao longo dos anos que tudo tem a ver com coração, com afetos, com prazer em estar diante daquele que me ama. Porque sou amado e aceito por Ele, sem necessidade de lhe dar algo em troca por isso, eu entendo a mensagem do Evangelho como dádiva.

E toda dádiva independe da resposta do alvo a quem ela se dirige. Uma dádiva é feita em nome de um carinho profundo, de um amor indescritível e que vai além da compreensão. 

Hoje eu me aproximo de Deus com tranquilidade, sabedor de que ele me recebe incondicionalmente por um ato que seu Filho realizou por mim. 
Eu não canto mais, como o galo para fazer o sol nascer.
Entendi a metáfora: quer eu cante ou não, tenha forças ou não para cantar, ele sempre me aguardará ao amanhecer. Sua misericórdia se derrama sobre mim em todas as manhãs.

Hoje eu sou um pouco mais poeta. Eu canto porque sei que o sol vai nascer.
È essa alegria que me motiva a viver e a propagar a sua mensagem às pessoas.
Aprendi que o filósofo tenta decifrar o enigma, mas o poeta se dedica a celebrar a vida.
Eu decidi celebrar.

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