terça-feira, 14 de agosto de 2018

Qual é a regra que você segue?



A gente se acostumou a associar regra a coisa ruim.

Nos mais diversos setores do convívio humano regra é vista como algo que limita a liberdade e impede pessoas de serem felizes. Se não tivéssemos tantas delas a vida seria mais simples, menos estressante e mais saudável, é o que se pensa.

Eu acredito que a regra não é por si mesma tão tirana assim. Os antigos filósofos clássicos elogiavam o ser de virtudes que se dirigia por escolhas menos dominadas pelo excesso. Quando fala da Lei, o apostolo Paulo reconhece que ela nos despertou a curiosidade para o mal, mas em si mesma, ela é boa e pura. Nós é que somos incapazes de sujeição a ela sem algum esforço.

Imagino se todos nós pudéssemos usar a liberdade sem nenhuma restrição e viver sem qualquer regra. A civilização como hoje a conhecemos simplesmente desapareceria, com disseram Nietzsche e Freud.

 Para Freud a cultura humana só pôde desenvolver-se a partir de um processo que sufocou as pulsões primitivas – a renúncia a estas pulsões são inculcadas na criança em sua primeira infância. Esta renúncia cobrará seu preço: em ‘O mal-estar na civilização’  Freud reconhece que, por mais segurança e bem-estar que a cultura - a civilização - tenha possibilitado ao homem, este continuará sempre nutrindo por ela um ódio profundo. 

“O que chamamos de nossa civilização é em grande parte responsável por nossa desgraça e [...] seríamos muito mais felizes se a abandonássemos e retornássemos às condições primitivas.”

Nietzsche, em tom jocoso, cita parte de um poema do alemão Heinrich Heine onde o mesmo comenta que a domesticação da civilização não conseguiu sufocar os instintos mais selvagens do ser humano. Diz o alemão pela boca do poeta mencionado:

“Minha disposição é a mais pacífica. Os meus desejos são: uma humilde cabana com teto de palha, mas boa cama, boa comida, o leite e a manteiga mais frescos, flores em minha janela e algumas belas árvores em frente de minha porta; e, se Deus quiser tornar completa a minha felicidade, me concederá a alegria de ver seis ou sete de meus inimigos enforcados nessas árvores. Antes da morte deles, eu, tocado em meu coração, lhes perdoarei todo o mal que em vida me fizeram. Deve-se, é verdade, perdoar os inimigos – mas não antes de terem sido enforcados”.

Claro que nem o filosofo nem o doutor apontavam como saída a volta ao estado primitivo, nem um apelo á selvageria e á descivilização. Cada um na sua área trabalhou para, no vocabulário psicanalítico, ‘sublimar’ tais pulsões destrutivas, permitindo que se expressem mas sem causar violência a outro.

De qualquer forma a regra é necessária para disciplinar esta nossa natureza selvagem e primitiva. O comentário que Jesus faz das leis é que elas não existiriam se não houvesse transgressão. Falando sobre o tema do divorcio certa vez, e questionado por que Moisés permitiu a carta de divórcio, ele respondeu que foi por causa da dureza do coração humano.

 Se o coração humano é duro e insensível, não há outra maneira de lidar com ele senão pela vida de uma regra que o deixe menos atrevido e mais consciente de que não vive isolado numa galáxia.

Regras existem e são necessárias para que tenhamos um ordenamento social e um ordenamento psíquico e um pouco mais ajustado. A palavra regra veio do grego ‘trellis’ de onde surgiu ‘treliça’. A treliça é usada para que a videira saia do chão e cresça, tornando-se produtiva. Ela serve como suporte de crescimento e de maturação.

 Se a regra é, portanto, como treliça, podemos vê-la não como inimiga mas como aliada em nosso objetivo de produzir melhor, sermos mais educados, cultivarmos a ética e vivermos sob um padrão regulatório.

 Num país como o nosso, onde a lei é descumprida e a ética, uma exceção, adotarmos regras para cada área de nossa jornada ajuda a formarmos um novo pensamento cultural. Quanto menos aceitarmos a quebra de regras mais rápido veremos tudo mudar á nossa volta, para o bem de todos nós.
Caleb Mattos.

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